Naqueles dez únicos e sagrados minutos da manhã de trabalho
que temos direito a um descanso fui à varanda ver o dia. Havia um lindo céu
azul! Olhei mais para baixo e enxerguei o baobá e a praça que tive muitos
momentos felizes com ela. Nessa hora pensei:
- Puta que pariu, quem foi o filho
da puta que inventou a saudade?
Não foi preciso terminar de
pronunciar toda a frase para ser puxado para o céu pela orelha.
- Ei meu irmão, você é meu anjo da
guarda. Não pode me agredir brother!
- Agora sou teu brother né? Se é nesse status que me
encontro, posso fazer sim o que fiz. Antes de você falar essa merda você pensou
no que ia dizer?
- Eita! Você fala palavrão?
- Não me enrola. Responda o que te
perguntei.
- É que essa saudade está me
matando. Vocês não podiam esperar mais um pouco para me ensinar esse tal de
livre arbítrio?
- Quer dizer então que quem
inventou a saudade é um fdp? - falou atrás de mim uma jovem forte e suave ao
mesmo tempo.
- É Ele? - perguntei ao meu anjo da
guarda com os olhos esbugalhados.
- Pô Deus, assim não dá! Essa
saudade está me consumindo!
- É justamente isso que gosto em
você: assume o que sente. Dá uma enrolada, é verdade, mas sempre está
assumindo. Você já disse isso pra ela?
- Como? Você foi me ensinar essa
tal de livre arbítrio...
- E onde está aquela perseverança e
força toda que coloquei em você?
- Atrás do medo de fazer besteira!
- Gostei de ouvir isso. É a
prudência que você sempre teve de sobra.
Zup!
Voltei para aqueles dez minutos de
descanso na varanda de Dudu. Agora eram somente oito.
Oito minutos de uma boa prosa com
uma menina que conheço de muitos carnavais.
Voltei para a minha tarefa e fiquei
há filosofar o dia todo em cima daqueles oito minutos.
Plim!
No dia seguinte fui transportado.
Enquanto voava pelos mares desse mundão de meu Deus ouvi um jovem dizer: Essa
menina já chega com cara de cansada!
Eu me vi respondendo: Ela é
descansada e não cansada. Ela é a mesma de outros carnavais e a mesma da
conversa dos oitos minutos. Navegando sobre os Sete Mares com o Pérola Negra
descobri porque ela é descansada.
Ela dorme sobre o Pacífico.
Um pouco mais à frente uma surpresa divina: estava
caminhando sobre as águas. Quando cheguei à terra firme passei a navegar até
chegar à cidade dela: Luanda, a cidade dos sonhos. Lá ela pode colocar o seu
projeto pra frente: revelar a alma das mulheres negras!
Zup!
Fui transportado para o Rio de
Janeiro. Vi-me subindo as ladeiras do Rio Comprido feliz no auge dos meus
quinze anos.
Zap!
Agora estava subindo as ladeiras de
Santa Tereza no bondinho.
- Aqui irmão. Vou subir o resto na
raça! - falei para o irmão que dava ritmo ao bonde!
A luz amarela da um ar de retrô,
todavia, como estamos dois séculos à frente, o retrô dava espaço ao medo da
violência. Não sabia onde ia encontra-lo, só sabia que estava lá, pronto para
sair para revelar algumas almas.
- Irmão, traz uma gelada pra mim na
moral! - disse ao garçom quando sentei na calçada em frente a um boteco de
esquina!
- Mas o senhor vai beber aí mesmo?
No chão?
- Vou sim irmão! ? Obrigado!
Fiquei por lá filosofando sobre
aqueles oito minutos, sentindo a brisa gostosa do Pacífico em minha face e
sentindo também a saudade tomar conta de mim. Poderia dizer até que era
"mais uma vez", no entanto, alguma vez ela foi embora?
No auge da saudade ele chegou e parou na minha
frente.
Lá estava ele: O fantasma que revela almas!
- Você me achou! - disse ele com um
sorriso largo no rosto.
- Mas é claro. Vim prosear contigo.
- Eu já sei até sobre o que é. Diga
a ela para seguir o caminho dela. Para ela se tornar fantasma também!
Eu sorri e olhei para o céu! Lá
estava ela a me guiar. No auge de toda a sua beleza, redonda e branca. Fechei
os olhos e agradeci a lua por estar lá e por trazer até mim a saudade gostosa
de tempos...
Quando desci o olhar o fantasma não
estava mais a minha frente. Olhei para a esquerda e o vi dobrando a esquina.
Coloquei o resto da gelada no copo
e fui andando atrás dele.
Andei por muitas ladeiras. Pude ver
muitos casais a enamorar sob a luz dela.
Mais saudade! E quando ela já me
tomava por inteiro uma grata surpresa.
Lá estava ele, mais uma vez imóvel
como uma estátua a olhar pelo buraquinho. Estava captando mais uma alma.
Boquiaberto fiquei ao ver que o
fantasma que era transparente começou a se transformar. Era gente como eu!
Captando as almas alheias o fantasma se torna ser humano! De carne e osso!
Captou a alma e voltou a ser fantasma. Foi em busca da
próxima alma!
Pra a minha surpresa quando acordei disso tudo,
o fantasma havia me deixado um presente: a fotografia feita na noite passada. Nela havia o rosto da mulher amada a pensar no amor!
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