quinta-feira, 2 de agosto de 2012

O relógio.

Sentado, segurava com as mãos a cabeça que teimava em cair. Juntamente com ela caiam as lágrimas que escorrem sem parar por seu rosto formando um enorme lago sob seus pés. Ao seu redor algumas pessoas. Diante de sua própria dor, não consegue reconhecer quem são. Só sabe que suas bocas metralham milhares de palavras por segundo. Olha para cima e diz:
- Por que senhor?
Ao mesmo tempo enxerga um relógio. Fica hipnotizado olhando os números até que percebe algo diferente. O relógio está voltando no tempo.
Boquiaberto espera ansiosamente o próximo minuto agarrado na cadeira.
Ao piscar os olhos recebe uma enorme onda de água. Ao piscar novamente se desespera. A cadeira se tornou um pequeno barco. As metralhadoras saíram das bocas e estão presas no barco. Elas atiram milhares de balas por segundo para todos os lados. Está em uma guerra sobre as ondas de algum oceano Deus sabe onde. Coloca as mãos para fora e começa a remar loucamente fugindo das balas que passar tão perto de seus ouvidos que as escuta dizer: Oi, talvez meu outro amigo que vem aí atrás te acerte.
Ao levantar a cabeça, vê que rema para a morte. O oceano na realidade é um grande rio que está se acabando. Vem aí uma enorme queda d'água. Se rasteja para o final do barco para remar-contra-a-maré.
Tudo em vão. Cai. Enquanto cai, a paz de sentir voando é uma mão que lhe acaricia a alma.
Em posição fetal cai na água e bate a cabeça no fundo do rio. Atordoado, abre os olhos aos poucos. Muito barulho e luz. Senti a sua cabeça molhada. Ao colocar a mão no local e leva-la próximo dos olhos, tudo está vermelho. Sua cabeça sangra. Junta forças e se senta. Ao se sentar vê em seus pés chuteiras e em suas pernas, meiões. Bermuda e camisa também estão nele. Um companheiro vem correndo lhe ajudar.
- Você está bem? - disse.
Demorou mais alguns segundos para entender que levará um cotovelada na cabeça jogando a final do futebol de campo nas  Olimpíadas.
- Onde estou? - perguntou assustado.
- É a final Peter. Estamos em casa contra os alemães.
- Que ano estamos?
- 2012. Você está bem?
- Sim, sim! Vamos jogar!
Levantou e foi em direção ao médico da seleção. Ele fez um curativo e o bravo jogador voltou para defender a sua Nação. Ao entrar novamente em campo todos gritavam seu novo nome.
- Peter! Peter! Peter! Peter!
Recebeu a bola e com um gingado e habilidade fora do comum no mundo britânico, partiu pra cima. Driblou até o juiz e "entrou com bola e tudo". O estádio veio a baixo.
- The game is over!! - gritava enlouquecidamente o locutor. Enxergava raiva no olhar dos torcedores ao gritar gol! O arbitro reiniciou a partida e assim que Peter pegou na bola, um alemão tamanho "G" lhe deu outra cotovelada. Estava no chão e, mais uma vez, ensanguentado. Só que dessa vez "o pau cantou". Enquanto alemães e britânicos se esmurravam, Peter se rastejava sem enxergar muito. Estava debilitado. Se rastejou e caiu no foço. Quando enfim bateu no chão escutou um enorme estouro. Terra e pedaços metálicos caíram sobre o seu corpo. Por alguns segundos ficou surdo, nos seguintes, ouvia zunidos até que minutos depois ouvia gritos e tiros. Sentou-se novamente e olhou para seus pés. As chuteiras deram lugar as botinas. Estava dentro de uma trincheira. Era a Segunda Guerra Mundial e ele, um soldado britânico. Em um segundo estava com medo, no outro confuso e no seguinte acendeu um cigarro e ficou esperando o relógio andar mais uma vez no tempo e leva-lo para outro lugar.
- Relógio, me tire daqui. Talvez para um mais agradável!

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