segunda-feira, 23 de julho de 2012

Por que ensina o professor a geografia da morte? - Pablo Neruda

Uma ano depois. Parado. Com a mesma roupa. A mesma cabeça cheia de idéias no vácuo. Na mesma varanda. Na mesma posição. Na mesma cidade. Antes, madrugada; hoje, a tarde.
O menino fica olhando a mesma vista de outrora.
Hoje conheceu, percebeu, um típico homem do agreste, o homem-lagarto.
Dentro de casa faz muito frio. As casas são coladas. Não entra muito calor. O que perpassa é a corrente de ar frio. Ficar na laje, hoje não tem graça.
Se ficar em casa deixará seu coração se tornar gelo. Precisa sair. Precisa se tornar lagarto.
Em um piscar de olhos não o vemos mais.
Está lá fora colado na parede. Na parte que faz sol. Quanto mais tempo o sol permanece na parede, mais tempo o lagarto permanece imóvel sobre os olhos aquecendo o seu coração.
Enquanto o homem-lagarto acompanha o sol pelas paredes e o menino fica sentado na varanda, sorrindo e pensa: O homem-lagarto é da família dos girassóis?
Bate a agonia novamente e o menino entra.
Vê seu companheiro ao lado de García Márquez psicografando mais um ponto.
Ainda agoniado caminha pela casa. Ervas, pão, vinho e mulheres.
Volta para a varanda. O homem-lagarto andou pouco.
Em transe o menino tem mais devaneios.
Fecha os olhos e se vê pulando da varanda.
Seu corpo sinuoso desvia dos fios de alta tensão e cai no mar gelado do polo sul.
Quanto mais nada para a superfície, mais sem folego fica. Para. Flutua dentro d'água. Entende a lógica.
Nada para o fundo. Quanto mais para o fundo, mais folego tem. Descola um caiaque com uma sereia. Troca  suas pernas pelo caiaque e por remos.
Transfigurado e com o pulmão cheio de oxigênio passeia pelos mares.
De repente desperta. Está Maysa a lhe chamar. Entra para ver o que quer.
O homem-lagarto estava à porta o convidando para aquecer seu coração.
Com suas pernas de volta corre e se joga na parede. Fica relaxado e feliz por lá.
Deste local vê a si mesmo na varanda conversando com Neruda que em espanhol lhe pergunta: Por qué se suicidan las hojas cuando se sienten amarillas?


Ao som de "La lune de Gorée" e "Se quiser falar com Deus" - ambas na voz de Caetano Veloso.


4 comentários:

  1. Ficou muito bem escrito! Cheio de metáforas complexas... Um grande refinamento na forma de fazer! Muito bom!

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  2. massa zé bob! ta escrevendo bem pakas brother! visualizei tudo ;)
    continue soltando o verbo!

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  3. chegou um momento do texto que eu me senti nadando no oceano gelado, depois de ter sentido o choque térmico de ter saído do sol pra geleira do polo sul...

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  4. Beth, muito obrigado pelo "um grande refinamento". Eu chego lá!

    Breno meu camarada, só em vc ler eu já fiquei feliz! Vou continuar rabiscando o papel!

    Mano... fiquei muito feliz em conseguir fazer com que vc ao ler viajasse no tempo e no espaço!

    OBG a todos que estão acompanhando!

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