sábado, 28 de junho de 2025

Desconexo

O trajeto é o mesmo, mas os pensamentos não. Se bem a agonia e o aperto em meu peito sem motivo são constantes. 

Enquanto dirijo muitos pensamentos por segundo fluem em mim feito tempestade. Nela o trovão nem sempre é precedido pelo raio.

Normalmente o raio conseguimos ver, mas jamais temos a exatidão de seu trajeto. O trovão sabemos que virá na sequência, no entanto, não sabemos mais nada sobre.

Vai balançar os vidros? Vai durar mais que cinco segundos? Seu som ecoará em mim?

Eis que um caramelo atravessa a rua do nada. Isso me remete ao perigo na esquina de Como Nossos Pais. Esta lembrança joga-me em Niterói, mesmo dirigindo a caminho do Recife.

Uma calça azul na calçada chama a minha atenção e isso me chuta do passado e me traz para o presente: Quem será que vestia aquela calça azul?

Um quebra mola, é hora de levantar o carro, pois a lata raspando o asfalto traz agonia nela. Isso me lembra que tenho que consertar o controle da suspensão, que terça-feira tenho médico e ao chegar em casa preciso tomar café da manhã. 

Ainda nem saí do meu bairro, por mim ainda estaria na cama. Só dormindo mesmo. Quero voltar para o sonho de quinta-feira. Lá é meu lugar. Estaria depressivo?

Um motoqueiro passa e quase morre imprensado entre nosso carro e uma carreta. Ele, nem aí,  mais uma manobra normal. Eu, nervoso, seria meu primeiro acidente de carro em dezessete anos de carteira. Mais seis meses e completo maior idade. 

De perto, quase não enxergo mais. Preciso focar, fica queito, é segredo. Lembrei que estou cansado e ainda são oito da manhã.

No ponto de ônibus, ninguém, em mim, o mundo. Minha letra está menor. Eita, uma peixaria, preciso comprar Tilápia. Na volta vejo isso. 

Uma criança aponta para o carro baixo e mostra a mãe. Será que a minha mãe já tomou café da manhã hoje? Respiro fundo. Dor de cabeça, uma pressão forte que há dias não foco nela. 

Três por cinco, diz o menino no sinal, mas não consegui ver o que era. Sinal amarelo, preciso passar, pois se parar, o doido que está colado talvez colida em nosso carro.

Chegamos. Ela me beija, diz "cuidado" e agora eu volto para casa onde, sozinho, estarei presente com meus muitos pensamentos desconexos.


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