E tudo voltou ao normal. Tenho
uma pilha de roupa para guardar, tenho que trocar a roupa de cama, lavar o
carro por dentro e por fora, conter meus sonhos megalomaníacos e fazer algo
para deixar de ser tão passivo.
Falar e falar, pensar e pensar
pelo visto não adianta mais, mas um dia já adiantou?
Encontro-me todo dia, numa
honestidade quase que divina questionando-me: o quê poderia eu fazer para um
fim diferente haver?
Entra ano e sai ano e os aumentos
são inseridos no meu orçamento. Gasolina, seguro de carro, passagem de ônibus,
o pipocão na rua, o meu sagrado chocolate e até o motel. Todo ano tudo aumenta,
menos o meu salário.
Quero deixar claro que a bronca
não está no não aumento do meu salário, mas sim no aumento de tudo que não é o
meu salário.
Acho lindas as justificativas (in)coerentes
que me são dadas. Não seria melhor me dizer “quero a sua grana e pronto”? O que
acho mais lindo é que essas “justificativas incoerentes” não mais são aceitas
quando a história muda. Quando sou eu que meto a mão no bolso dos outros e
digo: Brother, à vista você faz por quanto? Nesse momento a (in)coerência se
torna roubo, tendo na figura do eu, o agente do roubo.
Incrível né?
Mais incrível ainda é a minha
passividade. Não quero nem saber de você, das suas ações, e não o quero faz um
bom tempo. Quero saber de mim. Quero voltar a dormir. Nunca tive insônia e
agora tenho. Também, nunca dei tanto valor as minhas horas de trabalho. São
graças a elas que recebo meu salário no fim do mês.
Percebi hoje, que enfim descobri
o motivo pelo qual não durmo, o motivo pelo qual me sinto quase sempre
incomodado: Estão me roubando todo dia, na cara dura e o pior, eu estou vendo e
não faço ideia de como posso pará-los.
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