O Mestre
Negro!
Chapéu de palha artificial sobre os cabelos grisalhos. Uma vista o trabalho
insalubre deixou toda escura; a outra só tem 20% de sua capacidade, todavia, a
seu alcance é enorme. Roupas simples notoriamente gastas com o tempo. O chinelo
de couro constantemente desliza sobre o piso, o senhor aparenta estar ansioso.
Ansioso para colocar para fora as marcas que a vida lhe deu. Marcas essas que
estão na mão direita que segurou a enxada por muitos anos. Que amarrou a cana,
que consertou motores, que fez barulho batendo palmas nas rodas de coco. Nessa
mesma mão direita, a mão do cumprimento, ainda há os resquícios do cimento que
um dia ajudou a misturar. Nessa mão direita as linhas estão se apagando. A
barba grisalha e por fazer mostra de onde veio. Veio de longe. De um lugar onde
a voz é usada para contar prosas e cantar. Em uma tarde clara de sol, numa
tarde de primavera um senhor veio dar aos acadêmicos uma prosinha. Uma pitada
de luz e alegria iluminou à tarde de certo jovem. Esse jovem lembrou-se de seu
avô. Um avô que só lembra-se vagamente. Que a mente não mente ao lhe dar a
gostosa lembrança de alguns minutos no colo de seu avô ouvindo prosas, ouvindo
coisas da vida sob o olhar de seus pais. Naquele homem com barba por fazer, se
fez o retorno ao passado. Os jovens do presente que o trouxeram o chamam de “O
Mestre”. Os olhos de um jovem se inundam d’água com as frases do Mestre.
-
Hoje em dia o amor é caixão pra casal! – diz O Mestre.
Certos
encontros na vida estão marcados em linhas bem fortes, assim como as linhas da
mão direita do Mestre. O Mestre se diz analfabeto, afinal “só estamos prontos
quando nos passamos”, aí sim estamos alfabetizados. A mesma mão direita com que
escrevo, O Mestre escreveu na terra. A mesma mão direita que junta essas letras
para formar palavras, O Mestre usou para juntar a semente na terra; a cana com
a corda; a água com o pó; a graxa com o motor... Misturou a vida de trabalhos
pesados com a alegria de viver. Trouxe para nós o conhecimento de que somos
todos loucos e para não entrarmos em crise temos que ocupar a cabeça com toda
essa simplicidade de ser, que perpassa pelo vocabulário, pela vestimenta e
pelas atitudes. A sabedoria da vida está na maestria com que percorremos os
caminhos que nos são dados. Nesses caminhos haverá pedras, mas com uma
pitadinha de prosa nós as contornamos. As pedras nos deixaram marcas e apagaram
outras, no entanto, a maestria está em ao final de tudo sorrir, assim como faz
O Mestre.
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